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Até quando sonhos serão adiados?


style="width: 100%;" data-filename="retriever">O grande painel a giz ainda estampa 2020. Nele ficaram registrados os desejos da família de um feliz ano novo - viagens, felicidade, comida, suprimento, gatos e cachorros, livros, saúde, amor, piscina, paciência, respeito, praia, sorrisos, gratidão, filmes e cinema, harmonia e muito mais.

Na véspera, cada um escreveu os seus sonhos e desejos. O maior deles era realizá-los juntos. Alguns, diga-se importantíssimos, se concretizaram, considerando os tempos de peste - saúde, comida, suprimento. A maioria foi adiado, tendo em vista que a separação e o distanciamento foram inevitáveis para que se protegessem da mais grave doença que assola a humanidade.

Adiados porque felicidade completa é estarem juntos. Sempre foi assim, desde que passaram a ser e a se reconhecer como família. Sem novos registros no painel dos desejos, sobraram angústias, incertezas, ansiedade, saudade - saudade de doer. Inimaginável pensar, um ano separados.

O pior e o que continua a atormentar é que 2021 será novamente de distanciamento, sem abraços, sem presença. Os desejos do ano velho permanecerão na parede até o controle do vírus que muta e transmuta em variantes mais ferozes, agressivas e letais (sabe-se lá até quando!). Difícil não se abalar com este pesadelo, apesar do exercício diário para tentar evitar o tormento. Nem o dia de chuva que alenta a terra seca e traz viço e vigor às plantas, anima. Olhar pela janela, vê-las saudar a água que cai do céu e que alivia o castigo das temperaturas que se elevam cada dia mais no Planeta, também não é suficiente para aliviar a dor. Temperaturas cada vez mais altas, que fazem com que as plantas se retorçam em um ato de proteção para resistirem a mais um dia escaldante. Me protejo como elas - um estado de latência, guardando forças para resistir, aguardando a chuva que trará esperança e vida.

Neste vai e vem, nesta alternância que parece não ter fim se sucedem dias e noites, em um tempo igualmente infinito que ora voa e que ora para - desesperança alinhada à demora, à desorganização, à falta de vontade, ao agravamento. Até parece que belzebu e o vírus se uniram para gerenciar o tempo.

O túnel parece não ter fim. Quando um ponto de luz surge, o comprimento se agiganta, mostrando a luz diminuta e distante. Exaurido, cambaleante, o passo se acelera - é essencial não desesperançar. O mar nunca serena, imensas ondas surgem das profundezas engolindo tudo o que está próximo. Apesar do mar revolto e da nau navegando a esmo, o capitão relativiza, minimiza e aposta na cegueira, muda rotas e discursos.

A angústia aperta o peito, como comprimido pelo peso das patas de um monstro saído de livros de mitologia. Até quando haverá forças para resistir? Até quando os desejos do ano velho serão adiados? Até quando sentimentos serão pisoteados, agravando os quadros da doença, da ausência de ação efetiva, de acolhimento, compaixão e empatia?

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